42+%5B640x480%5D.jpg)
Pode-se dizer que o cinema português ganhou um actor. Nuno Markl foi fortemente elogiado pelo seu desempenho em "A Bela e o Paparazzo". Numa conversa com a UGA, o humorista falou como correu a sua incursão pelo mundo cinematográfico, da transferêcia para a Rádio Comercial e até dos Gato Fedorento.
Esta foi o teu primeiro papel como actor. Como surgiu o convite?
Foi como cair de uma ribanceira abaixo e não consegui controlar e brum!! Começou com um telefonema do António-Pedro Vasconcelos a dizer que tinha uma personagem no seu filme novo que se adequava a mim. Mas sou a segunda escolha porque a primeira não podia fazer o papel. Inicialmente estava aterrorizado. Fiquei muito honrado, mas disse-lhe: “Eu não tenho qualquer experiência, só sei fazer de mim próprio e mal”. Eu fiquei com a ideia que ia ter um papel muito curto, mas quando me mandaram o argumento via “Tiago” [nome da sua personagem] em todo o lado e só pensava: “Mas como é que eu vou fixar isto, não sou actor, não tenho qualquer experiência a decorar textos”. Mas pronto, lá decidi aceitar o convite.
E como correu?
Tentei não stressar muito porque comecei a olhar para a personagem como uma versão alternativa de mim e num universo alternativo. É como se eu não tivesse tomado algumas decisões no meu passado e que me levaram até onde estou hoje. Possivelmente teria acabado como um tipo com ideias, mas sem sítio para as pôr, como o “Tiago”. Tal como a ideia de transformar um prédio num país, é por um lado um tipo que tem demasiado tempo livre, e por outro, um tipo tem lá uma coisinha de revolucionário dentro, mas que não se quer chatear muito e sair do sofá.
Estás a descrever a tua personagem…
Sim… O “Tiago” é também o ombro amigo da personagem do Marco [D’ Almeida]. Foi um desafio para mim, porque estou habituado a entrar em sketches muito curtinhos e agora uma coisa grande com nuances destas, que num momento estou a fazer uma palhaçada e no outro estou a abrir o coração sobre um desgosto amoroso… é uma coisa de loucos. Eu pensei se conseguir sobreviver a isto, sobrevivo a tudo.
Identificaste-te com a tua personagem?
Bastante. É quase ficção científica, é como se eu tivesse ido ao passado. Aquele Nuno é o que não foi tirar o curso de jornalista no CENJOR, decidiu ficar em casa a escrever umas coisas e ir tentar vender as suas ideias sem ter qualquer suporte. E por isso eu achei que era interessante representar o Markl da quinta dimensão.
Como te preparaste para o papel?
Explorei brutalmente a minha namorada que fez todos os personagens com quem eu contracenava. Este indivíduo é tipo eu… O meu humor é sempre na primeira pessoa, por isso para não stressar muito tentei imaginar que isto era o Markl Mix… foi essa a lógica da minha preparação.
Já estás a pensar na próxima experiência como actor?
Não estou minimamente a stressar com isso. Se esta for a minha única experiência em cinema por mim está óptimo. Adorei fazer isto, o ambiente era óptimo, ficamos com saudades uns dos outros. A química que se gerou entre mim, o Marco D’Almeida e o Pedro Laginha foi tão grande que parecia que vivamos juntos há anos.
“Tenho um longo historial de fracassos que me orgulho muito”
Já és uma referência do humor em Portugal ou ainda não chegaste lá?
Nunca pensei na coisa nesses termos. A minha lógica é ir fazendo as coisas… Se correm bem, muito bem, se correm mal, tudo bem na mesma. Não me arrependo de nada que fiz até ao momento, mesmo das coisas que correram mal. Tenho um longo historial de fracassos que me orgulho muito, que vão desde a Paraíso Filmes até ao "Programa da Maria", mesmo o "Herman Enciclopédia", que aquilo na altura não teve audiências nenhumas de jeito. Faz tudo parte do pacote. Referência parece uma coisa velha, para que estou aqui há uns 50 anos, como o Ruy de Carvalho, e ainda tenho mais coisas para fazer.
Se não és referência no humor, és com certeza o Rei do Twitter…
Parece que sim. A Ana [Galvão] diz que eu sou o Rei da Internet. Mas agora estou mais no Facebook. O Twitter é muito engraçado, mas os 140 caracteres têm tendência a limitar bastante. O Facebook deixa-me escrever um bocadinho…
Consegues fazer passar muito do Nuno Markl nestas redes sociais…
Sim e há muito re-tweet. Eu acho giro porque tenho a sorte de ter uma comunidade com um espírito de família.
Costumam influenciar muito o que escreves?
Sim, principalmente agora com o meu novo programa “Caderneta de Cromos”, que tem uma página no Facebook onde as pessoas podem partilhar. Começaram a fotografar e a gravar vídeos das suas próprias colecções de coisas antigas, de infância e vê-se pessoas com quase 40 anos a jogar ao "Dragon Ball".
“Tinha saudades de trabalhar no ambiente da Comercial”
Por falar em rádio. Porque trocaste a Antena 3 pela Rádio Comercial?
Sabes uma coisa que não se explica? Senti-me como um cão vagabundo, com a missão na Antena 3 já cumprida e com vontade de experimentar de ir para outro lado. Tenho muito afecto por aquilo que fiz na Antena 3. O Pedro Ribeiro estava a assediar-me e, com todo o respeito e admiração que tenho pela Antena 3, pensei: “De facto tenho algumas saudades. Não quero deixar as pessoas na Antena 3, mas eu tenho saudades de trabalhar com o Pedro Ribeiro naquele ambiente da Comercial”.
O que esperas do ano 2010?
Estamos a esboçar o regresso dos “Contemporâneos”, mas ainda não sabemos como vai acontecer e em que moldes vai acontecer. Há uma vontade muito clara da RTP que haja “Contemporâneos”, só que a equipa está tresmalhada. Parece aqueles filmes que nas sequelas têm que ir buscar o Rambo ao Tibete. O Eduardo Madeira está na SIC, o Bruno e o Nuno Lopes estão a fazer teatro.
“Os Contemporâneos” não ficaram unidos como os Gato Fedorento…
O espírito dos “Contemporâneos” era muito diferente. Fazendo uma comparação estrangeira pomposa é como os “Saturday Night Live”, que as pessoas estão lá unidas durante o programa, mas toda a gente tem os seus projectos independentes. É uma coisa em que entram uns, saem outros. Há um conceito e um espírito, mas tem um formato muito versátil onde se pode reinventar continuamente. Os Gato Fedorento cresceram juntos, só conseguem separá-los se aparecer uma Yoko Ono.
“Agora temos “Dr.” no cartão de crédito sem ter curso”
Andaste na faculdade?
Não. Não tinha médias para entrar na faculdade, esse era o meu grande drama. Quando estava no secundário, em vez de estudar gastava o meu tempo na Rádio Pirata ao lado na Rádio Voz de Benfica. Chegou a altura da faculdade e não tinha médias para ir para Comunicação Social e por isso fui fazer o curso do CENJOR, de formação de jornalistas. Tive um ano intensivo para aprender tudo e depois fui colocado no Correio da Manhã Rádio e as coisas foram encadeando umas nas outras.
Agora também não te podes queixar…
Agora não. Também agora temos “Dr.” no cartão de crédito sem ter curso.
Por Joana Miranda